Tudo sobre Forame oval patente (FOP)

Por Ana Vitória Vitoretti – Especialista em Cardiopatias Congênitas pelo InCor/USP.

Já parou pra pensar qual sua chance de atender um paciente com FOP ? ENORME !  A prevalência na vida adulta desta alteração é de cerca de 25%-30%, e mesmo não sendo cardiologista a chance de você atender ou conhecer alguém com esse diagnóstico é considerável. Dessa forma, vou colocar aqui alguns conceitos chaves para você levar pra sua vida.

 A comunicação entre os átrios através da fossa oval é fundamental durante a vida intrauterina e habitualmente se fecha após o nascimento.Quando este fechamento não ocorre teremos o que chamamos de forame oval patente, popularmente conhecido como FOP .

E quais as implicações ? Na maioria dos casos esta alteração não vai gerar repercussões ou complicações. As implicações ocorrem quando há formação de um trombo (no sistema venoso) e este passa do lado direito para o lado esquerdo através  do defeito do septo ; ao atingir o lado esquerdo o trombo pode atingir algum ramo arterial e causar como evento clínico um AVC. Outras manifestações associadas também são descritas, apesar de serem menos discutidas no contexto do FOP, como migrânea,doença descompressiva em mergulhadores  e síndrome de platipneia-ortodeoxia – dispneia e dessaturação que ocorrem ao assumir ortostatismo e com melhora na posição supina.

Figura 2 – representação esquemática do FOP
 

 A avaliação e pesquisa de FOP está indicada nos casos AVC criptogênico ou na presença de eventos que possam estar relacionados ,como síndrome de platipneia-ortodeoxia. Vale relembrar que o AVC criptogênico  é aquele em que não encontramos causa após extensa avaliação de causas neurológicas, cardiológicas e trombofílicas e representa cerca de 30% dos AVCs. Quando avaliamos o grupo isolado dos AVCS ‘s criptogênicos,a prevalência de FOP é superior à da população em geral, podendo ser evidenciado em até 40% dos pacientes. 

Em relação aos métodos diagnósticos podemos pensar em 03 métodos – eco transtorácico (ECOTT), doppler transcraniano e eco transesofágico(ECO TE). O ECO TT é na maioria das vezes o método inicial pela ampla disponibilidade e o mesmo deverá ser realizado com administração de solução salina agitada e realização de manobras que aumentam pressão em átrio direito ,como manobra de Valsava, permitem sensibilizar esse tipo de avaliação. 

Figura 3 – Avaliação do FOP no ECO TE na sístole e na diástole

O Doppler transcraniano é outro exame que permite detectar shunt D- E , mas não permite definir o local do shunt,além de ser pouco disponível em nossa prática. O grande exame neste tipo de avaliação consiste no ECO TE que deve ser realizado com infusão de microbolhas no repouso e seguido por manobra que aumenta a pressão no átrio direito . O ECO TE é fundamental nos casos que o ECO TT é negativo ou inconclusivo,além disso o ECO TE permite melhor avaliação da anatomia do FOP, o que é fundamental quando se pensa em programar alguma abordagem. A avaliação do diâmetro do FOP e a pesquisa de presença de aneurisma do septo atrial devem sempre ser realizadas, já que estes são fatores que sabidamente aumentam risco da associação de FOP com AVC.

E nesse momento , chegamos ao ponto crucial e de grande debate nos últimos anos – devemos fechar o FOP ?  E a resposta vai vir atrelada a uma série de informações , tais como história clínica, eventos prévios e avaliação por método de imagens. O mais importante será definir com clareza o mecanismo do AVC e se realmente o mesmo é considerado criptogênico, nesse momento muitas vezes se faz necessário discutir o caso com neurologista . Após, devemos definir as características de maior risco associado ao FOP – pacientes mais jovens , FOP de grande tamanho, presença de shunt moderado a grave e associação com aneurisma do septo atrial .O escore  RoPE ,publicado em 2013 ,  avalia a chance do FOP ser a causa do AVC criptogênico . As variáveis desse escore são as seguintes: ausência de história de diabetes ou hipertensão ou AIT/AVC  prévios ou tabagismo ; isquemia cortical  e idade (quanto mais jovem e quanto menos comorbidades maior a pontuação). O escore não deve ser usado de forma isolada, contudo seu uso junto com análise de outras características clínicas ajuda na definição de conduta.

 De forma geral , o fechamento do FOP deverá ser indicado nos pacientes com idade inferior a 60 anos, história de AVC criptogênico e características de maior risco associado à avaliação ecocardiográfica.

Em relação a forma de fechamento do FOP o método percutâneo é o preferencial . Até o momento não temos estudos comparando fechamento percutâneo com fechamento cirúrgico de FOP, mas não há indicações de fechamento cirúrgico como terapia de primeira linha. Quanto às possíveis complicações do procedimento percutâneo podemos citar : hematoma no sítio de punção, trombose do dispositivo, embolização do dispositivo e fibrilação atrial (FA). 

Figura 4 * – Representação esquemática do dispositivo de fechamento percutâneo do FOP

Uma metanálise publicada no EHJ em 2018 englobou 5 estudos e 3440 pacientes  comparou o tratamento medicamentoso com a oclusão de FOP  na prevenção de AVC criptogênico. O estudo mostrou superioridade do tratamento intervencionista em relação ao tratamento conservador na prevenção do AVC isquêmico. Além disso , a metanálise mostrou que o risco de FA foi significativamente maior no grupo intervenção.

Após o procedimento percutâneo o paciente deverá ser mantido com terapia antiplaquetária dupla (AAS +clopidrogel) por 1 a 6 meses ,após esse período o paciente deverá ser mantido com um antiagregante plaquetário( sem antiplaquetário de preferência) até completar 5 anos. Além disso, vale lembrar que a profilaxia de endocardite com antibióticos antes de procedimentos invasivos deverá ocorrer nos primeiros 06 meses após abordagem percutânea.

Todas essas informações são o resumo do que foi publicado nos últimos anos ( muita coisa!) . De forma resumida é sempre bom lembrar:  FOP não é tão simples quanto parece e sempre devemos realizar uma avaliação cuidadosa já que a alteração não terá repercussões significativas na maioria das pessoas e o procedimento de fechamento percutâneo tem riscos associados.

Ana Vitória Vitoretti – Especialista em Cardiopatias Congênitas pelo InCor/USP.

REFERÊNCIAS

  • Alkhouli M, Sievert H, Holmes DR. Patent foramen ovale closure for secondary stroke prevention. Eur Heart J. 2019 Jul 21;40(28):2339-2350.
  • Fareed Moses S. Collado, Marie‐France Poulin, Joshua J. Murphy, Hani Jneid, and Clifford J. Kavinsky. Patent Foramen Ovale Closure for Stroke Prevention and Other Disorders.American Heart Association. 2018;7:e007146
  • Ahmad Y, Howard JP, Sen S et al. Patent foramen ovale closure vs. medical therapy for cryptogenic stroke: a meta-analysis of randomized controlled trials. European Heart Journal (2018) 39, 1638–1649.
  • Thaler DE, Di Angelantonio E, Di Tullio MR, et al. The risk of paradoxical embolism (RoPE) study: initial description of the completed database. Int J Stroke. 2013;8(8):612-619.

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